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Ser, desvanecer e reaparecer em outro lugar

Nino Cais em diálogo com Olivia Ardui

Um pensamento orgânico, maleável e mutável, onde uma ideia leva a outra, uma imagem chama uma outra, em uma rede de associações em incessante transformação. Com Nino Cais, a metamorfose se realiza no âmbito do pensamento, da palavra e da imagem. De fato, o conceito parece apropriado para ler e abordar a obra do artista uma vez que transfigurações estruturam tanto o seu processo criativo quanto o conteúdo imagético dos seus trabalhos. Em seu ateliê, o artista delineia um novo itinerário para as imagens que coleciona: ele as manipula, amputa, sobrepõe e associa com outras, operando colagens tanto semânticas quanto visuais. Esse processo compositivo fluído também se manifesta na contínua metamorfose de seres e objetos que povoam suas obras. Seja nas inúmeras identidades que assume e incorpora nas suas fotografias encenadas, nos seus objetos híbridos ou antropomórficos ou ainda nas situações de equilíbrio frágil que já anunciam a sua própria queda.

Ser, desvanecer e aparecer em outro lugar apresenta uma série de estudos realizados no interstício de conversas centradas na reflexão sobre o processo criativo do artista, nas quais o elo comum das metamorfoses surgiu. O artista foi instigado pelo mundo fictício das Metamorfoses de Ovídio, um dos textos da Antiguidade greco-romana que mais contribuíram para a constituição de uma matriz cultural europeia e que tem ecos até hoje tanto na literatura e na música quanto nas artes plásticas. O livro constitui um entrelaçamento de uma série de fábulas que tem como denominador comum a transfiguração de indivíduos e deuses em elementos naturais ou animais, entre as quais podemos citar as transformações de Narciso em flor ou de Dafne em árvore.

Fomentado por esse imaginário greco-romano, a metamorfose aparece como princípio motor de muitos dos estudos presentes na mostra. Alguns estudos evidenciam de maneira mais explícita a desarticulação das imagens encontradas, com seus recortes e incisões deixando espaços vazios, desenhos em negativo. Em outros trabalhos, esses vazios já foram preenchidos por uma gradativa mudança de forma ou de estado, como, por exemplo, na escultura central cujo busto se transmuta em uma superposição de louças para finalmente formar uma coluna antropomórfica. Peças mais antigas acompanham esses trabalhos e evidenciam a continuidade desses encadeamentos de ideias e associações de imagens na obra de Nino Cais.

Se nas histórias de Ovídio as transfigurações são definitivas no sentido que os personagens adotam uma nova essência e passam definitivamente de um estado a outro, na obra de Nino Cais os objetos e seres se dissolvem, mas nunca deixam de ser o que eram inicialmente. Ao contrário, tal como aliterações, eles se prolongam, se respondem, desaparecem para finalmente reaparecerem com outra forma, em outro lugar

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